Prefeito é afastado por superfaturar merenda
O Ministério Público (MP) pediu à Justiça que responsabilize o prefeito de Vinhedo (SP), Milton Serafim (PTB), por improbidade administrativa, perda da função pública e, com mais seis pessoas, devolva R$ 3,3 milhões aos cofres públicos. O dinheiro foi usado na compra de alimentos para a merenda de pelo menos 10 mil alunos da rede pública no ano passado. A aquisição foi feita no contrato 44/2013, tipo pregão menor preço por lote. Segundo o promotor Rogério Sanches, os preços dos alimentos foram superfaturados.
A ação do MP pede a nulidade do contrato e cita outros quatro integrantes da administração como responsáveis pela devolução do dinheiro: o vice-prefeito Jaime César da Cruz, o secretário de Administração, José Pedro Chaum, o controlador-geral, Elvis Tomé, e a diretora de compras, Bruna Cristina Bonino. Os empresários César Imperato Iotti e Maria Helena Imperato Iotti, da Cecapa Distribuidora de Alimentos Ltda, completam a lista.
Segundo Sanches, se um deles devolver o valor integral, os demais ficam isentos. O MP, no entanto, pediu à Justiça multa de duas vezes o valor do contrato para cada um dos citados, caso a devolução não seja feita. A ação solicita ainda perda de direitos políticos e proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais.
Carne moída a R$ 25,86
“... nota-se claramente a prática de superfaturamento. Com efeito, em quase todos os lotes de produtos adquiridos os valores de aquisição se mostram absolutamente destacados da realidade”, descreve o promotor na ação civil pública, impetrada no dia 21 de fevereiro.
Entre os exemplos, estão 40 toneladas de carne bovina (patinho) por R$ 25,86, mesmo valor das 20 toneladas de carne moída. Em outro lote, a compra foi de 11 toneladas de cortes de frango em tiras e sobrecoxa de frango, a R$ 20,25 o quilo, além de 6,8 toneladas de sobrecoxa, que custaram R$ 18,54 o quilo. Em relação à carne de peixe, a administração pagou R$ 21,70 o quilo do filé de mandirá. Dez toneladas de filé de tilápia foram compradas a R$ 31,13 o quilo.
Comparação
No comparativo com outras prefeituras, o MP aponta a evidência do superfaturamento. “A carne bovina, por exemplo, comprada pela Prefeitura de Vinhedo a R$ 25,86 o quilo, foi adquirida também pela Prefeitura de Penápolis/SP, no mesmo ano de 2013, e da mesma marca (JBS) a R$ 13,90.
O mesmo ocorre com a almôndega de carne bovina, que em Vinhedo foi comprada por R$ 21,30; em Penápolis, o preço foi de R$ 9,90 pelo produto da mesma marca. É um detalhe: naquela localidade, o total da carne bovina foi de uma tonelada e duzentos quilogramas; em Vinhedo, foi de 40 toneladas; as almôndegas, em Penápolis, somaram setecentos quilogramas, ao passo que em Vinhedo foram compradas de toneladas, circunstância que deveria contribuir para a diminuição do preço, não para o contrário”.
A Promotoria ainda aponta comparativo de preços em relação ao município de Nova Odessa (SP). “No registro de preços para aquisição de 25 toneladas de carne moída naquela cidade, o máximo foi estabelecido em R$ 13,40 o quilograma. Em Vinhedo, por 20 toneladas, foram pagos R$ 25,86 o quilograma”.
Os cortes de frango também revelam preços diferentes. Conforme se extrai de contrato firmado pela Prefeitura de Campinas para compra de frango. A administração da metrópole pagou R$ 7,54 o quilo pelo peito de frango. Neste caso, a Promotoria Pública afirma “ Fato que a quantidade comprada consideravelmente maior. Mas o valor em Vinhedo (R$ 25,04 o quilograma), por onze toneladas e meia, absolutamente fora de propósito”.
Campinas, novamente citada no processo, pagou pelo frango em tiras a R$ 6,88 o quilo; em Vinhedo, foram pagos R$ 20,25 por produto semelhante. A coxa e a sobrecoxa, que em Campinas foram adquiridas por R$ 6,90 o quilograma, em Vinhedo foram por R$ 18,54, segundo o MP.
Sem comentários
A Prefeitura de Vinhedo, por meio da assessoria de imprensa, informou que os integrantes da administração não foram notificados sobre o processo e, por isso, não vão se pronunciar sobre o pedido feito pelo promotor Rogério Sanches à Justiça. No inquérito, representantes da Prefeitura e das empresas citadas disseram que os preços mais altos se referem a transporte, entrega e armazenamento dos produtos, inclusive o congelamento.
A Prefeitura chegou a abrir uma investigação interna, que nada de irregular constatou. Procurados pelo G1, os empresários César Imperato Iotti e Maria Helena Iotti não retornaram às ligações nesta terça-feira (25). A Justiça ainda não se pronunciou sobre o pedido da Promotoria. Os representantes da administração e da empresa precisam ser citados e têm prazos para defesa.
CPI e novo processo
Por duas vezes no ano passado, a Câmara de Vereadores tentou abrir uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar os preços praticados, mas não obteve as cinco assinaturas necessárias entre os 15 vereadores. Periodicamente, a Casa recebe cópias dos contratos e o da merenda foi investigado pela vereadora Marta Leão (PSD). “Levei um susto. Sou dona de casa e vi que os preços estavam altos. Almôndegas a R$ 21,00 o quilo é demais. São várias as irregularidades (licitação) e espero que sejam punidos”, opina a parlamentar sobre o pedido feito pelo MP à Justiça.
Outro contrato da prefeitura está sendo investigado, segundo o promotor Rogério Sanches. Desta vez, em produtos estocáveis para preparação de merenda. No caso do açúcar, tipo refinado, microcristalino, o pacote de um quilo custou para os cofres públicos R$ 4,08 em novembro de 2011. O mesmo produto em agosto de 2011 custou R$ 1,86. Em agosto de 2012, R$ 1,790 era o valor. Em outubro de 2013, o valor pago foi de R$ 1,290. "Este contrato é pior que o outro", alega o defensor público.
Denúncias e queda nos preços
Após as denúncias, a Prefeitura realizou um pregão que resultou na queda no valor dos produtos em até seis vezes. Um dos exemplos é o açúcar refinado cristalino, comprado por quilo. O valor anterior foi de R$ 4,08. Após o início das investigações e denúncias, o valor pago foi de R$ 1,29, redução de 216%.